(Soneto não premiado)
ACREDITAR
Em que acreditas tu, que não te ergueste
Assim que as labaredas te assolaram
E nelas te lançaste e te perdeste
No mar de fogo que outros te atearam?
E porque não crerás, se assim colheste
O muito que os demais lá semearam,
Na terra e no folhelho em que acendeste
O lume em que essas chamas te queimaram?
Terás, ao menos, visto que sobraram,
Dos sonhos que sonhaste e não viveste,
Sementes, que as fagulhas nem tocaram
Na raiz desse tanto que escondeste,
Inteiras, porque a terra perfuraram,
Que brotaram de ti, quando em ti creste?
Maria da Vírgula (pseudónimo)
Maria João Brito de Sousa
Que tristeza tao inútil essas mãos
que nem sequer são flores
que se dêem:
abertas são apenas abandono,
fechadas são pálpebras imensas
carregadas de sono.
Pela noite adiante, com a morte na algibeira,
cada homem procura um rio para dormir,
e com os pés na lua ou num grão de areia
enrola-se no sono que lhe quer fugir.
Cada sonho morre às mãos doutro sonho.
Dez-reis de amor foram gastos a esperar.
O céu que nos promete um anjo bêbado
é um colchão sujo num quinto andar.
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