Viva a Vida !

Este blog destina-se aos meus amigos e conhecidos assim como aos visitantes que nele queiram colaborar..... «Olá, Diga Bom Dia com Alegria, Boa Tarde, sem Alarde, Boa Noite, sem Açoite ! E Viva a Vida, com Humor / Amor, Alegria e Fantasia» ! Ah ! E não esquecer alguns trocos para os gastos (Victor Nogueira) ..... «Nada do que é humano me é estranho» (Terêncio)....«Aprender, Aprender Sempre !» (Lenine)

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Ouse sonhar ...


Fotos de Paula Pereira - Fotos do Mural

Foto 139 de 141   Retroceder para Álbum · Fotos de Paula · Perfil de Paula

.
.
.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

O insólito


Fotos de Ana Ruas - Fotos de Perfil

Foto 3 de 6   Retroceder para Álbum · Fotos de Ana · Perfil de Ana

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A Donzela - Clara Esteves



por Maria Clara Roque Esteves a Segunda-feira, 8 de Agosto de 2011 às 0:33
                     A DONZELA

Um ramo de raios de sol
Serpenteia serenamente e
Surpreende a donzela que depressa
Devassa o desejo.
Gestos perfeitos
Autoridade no coração
Labirinto de sensações
De curta duração.
Aparentemente
O sol parecia semear acalmias.
Amorosamente alguém apanhava e sentia
Viçosos malmequeres
Expressão simples de fantasia.
No corpo e na alma
Uma lógica de mel
Angústia marmórea na pele
Gotas grandes, azuis nos olhos e
Um enredo espantado
Traficando equívoco de saudade.
Antes que a lua soletre a tarde
A donzela desmorona a verdade
De lembranças frágeis
E chora num claro choro
Feridas de flor sem fruto.
No chão negro, parado e secreto
Estende os braços ao vento inquieto.
Acordam no céu as primeiras estrelas,
Fora do tempo, dentro do destino
A donzela adormece em orgulho divino.

Clara Roque Esteves
 ·  · Partilhar
Victor Nogueira Olá, Clara. Grato pela presença/lembrança/present​e :-)*
há 22 minutos · Gosto
.
Victor Nogueira E retribuo com uma receita do milénio passado, quando ainda escrevia poesia ou o que tal dizem-me ser:
.

    RECEITA PARA UMA MENINA CALADA
 
    Em toalha de renda
    planta-se uma seara de gestos e palavras
    sem novelo, q.b.
    azul de amizade, macia como veludo
    murmúrio do mar com sol a nascer
    ósculos, dois, odoríferos
    Estende-se bem e junta-se um traço de união
    ternura e uma esmeralda.
    Leva-se ao lume em fogo brando.
    À parte no almofariz mistura-se
    uma pitada de sal, pimenta, salsa, vinho e pão
    Junta-se tudo e agita-se com delicadeza suave.
    .
    Serve-se fresco com doce riso sem rodelas
    au clair de la lune
    Próprio para qualquer estação

    acompanhado de açucenas
    malmequeres
    orquídeas e
    rosas em fundo verde
.
    FIM

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Um raio de lua ( para a minha neta Marta) - Clara Esteves


por Maria Clara Roque Esteves a Quarta-feira, 3 de Agosto de 2011 às 23:11
Dezoito anos!
Quando nesse dia te vi
O amor que senti
Demoliu os meus invernos.
Depositei-o em ti
Como se foras caixa-forte.
Teci uma trança
Com os raios da lua
(eram os primeiros trinta minutos do dia quatro)
Com tanto empenho
Que ainda hoje a retenho,
Alegria acumulada,
Esperança repartida
Em laços de seda envolvida.
Mas mais do que amor ou ternura
Há um modo de bem-querer adjacente:
Transportas contigo
A amplitude de um oceano transparente.
E nas ondas que beijam dolentes a minha praia
Vejo que existes para além de mim,
Que os ciclos se confundem
E que mais do que ESTARES,
O SERES
Dá um especial sentido à minha vida..
Como o sol que brilhou hoje
És o meu tenaz orgulho
E na tua beleza amável
Quero que cumpras os sonhos
E que a Vida, no seu jogo de perde ganha,
Te encha de muitos momentos risonhos.

Com um beijinho muito especial da vovó.

(Agosto, noite de 3 para 4 de Agosto de 2011)

Clara Roque Esteves



 ·  · Partilhar
.
(...)
.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

a pancada sáfara - Carlos Teixeira Luís

a pancada sáfara

por Carlos Teixeira Luis a Terça-feira, 2 de Agosto de 2011 às 9:46


(1)
sou homem mulher criança velho ser vivo animal
a pancada
todos vocês que não perdoam o poema longo aprendiz de realista quem ensina o jogo e quem o aprende
a pancada sáfara
o que pensa que sim a ignorância o medo a pancada do diabo que sabe bem o jogo
o anjo com a culpa e a santidade
o sexo o prazer a saúde que se perde na esquina o rock and roll e uma pitada de blues o que acredita em deus paredes meias com o que não acredita em deus o agnóstico ateu e existencialista o zeloso na fé e a perde o homem os homens as mulheres e a totalidade das crianças bem comportadas as crianças problemáticas e rebeldes e as inquietas
levanta e senta grita e está calado está sossegado e estás sossegado demais não mijes na cama e não comas bolachas na cama não vejas isto na televisão e vê isto na televisão
que diz a carne
não andes à chuva e vai estudar  não estudes e vai brincar não brinques e faz os trabalhos não é hora de rir e chorar podes rir e chorar deita agora e levanta agora e mais aquilo e um pouco mais do resto e mais do mesmo e do sagrado original
sou velho todos os velhos não corro mais não trabalho mais sou a doença demoro a subir escadas não ouço os pardais não mijo sempre que quero não sei o que fazer com o eu decadente sirvo para nada dou trabalho um empecilho lixo que ninguém quer despejar um saco de órgãos morto e não enterrado
sou a criança e o adulto a criança com corpo de adulto o adulto com mente de criança o homem sem corpo a voz de homem sem cor a criança com corpo de mulher com borbulhas e bipolar sem solução final os neurónios e células enlouquecidas os impulsos fortes e fracos e contraditórios o alvo da publicidade usado e esticado abandonado como qualquer um
a mulher seios e ancas e vagina linda e bela feia e gorda velha e nova a outra que passa na rua a sociedade em cima dos ombros a norma de beleza própria e ridícula a mãe e amante santa e bela economista e gestora carrasca e governanta máquina de sexo e  máquina de lavar fogão humano e mais ao dobro a filha a avó a poetisa a escritora a administrativa a secretária sarcástica e louca tudo ao mesmo tempo verme e terra porque já morri faz tempos
o homem comum não há outro a mulher com pénis a força para dar murros os genes da guerra o desejo da paz a mentira de que não se fala as lágrimas estranhas a arrumação do impensável o caixote por deitar fora o que é necessário o que não sabe envelhecer e envelhece o genes da estupidez decalcado na pedra o machista e sexista e racista a negação e tudo mais que não lembra
a poesia não lida o livro por ler a poesia e  qualquer coisa escrita o livro que tem vergonha de ser policia e ladrão o dicionário inútil as coisas que não se percebe o raio que parta da literatura que ninguém sabe o que é e para que veio
o banco sem cheta os bancos de jardim o assento dos criminosos e do pior dos santos a prostituta e o embriagado a igualdade de direitos do pobre ou o que for
o rebelde que não sabe para que serve o revolucionário que vende t-shirts para matar a sede o bem comportado farto de o ser o que paga os impostos todos e é preso o esperto e o parvo o vagabundo e o novo-rico e aquele assim e assim o boi humano a vaca e a minhoca qualquer coisa e por pensar em qualquer coisa
o que já aprendeu o jogo o que se esquiva dos golpes baixos dos golpes à bruta o que sabe defender e  morre na mesma a força e o sangue a fé e as lágrimas secas o sopro e o trabalho que dá a enterrar um corpo que morre
a guerra espiritual sem precedentes a guerra sem excepção e confusa paga a prestações de sangue paga por quem não recebe o recibo final a guerra dos relacionamentos humanos a guerra da confiança que bate com a cabeça na desconfiança que se dilacera no desapontamento a guerra e a estranha paz a economia que se derrete e não muda
os tubarões que continuam a comer os peixes que se deixam devorar os olhos que nunca abrem o dinheiro que sempre falta o dinheiro diferente da sobrevivência da capacidade de reprodução os diamantes de sangue e os que não brilham o tecto e a comida e pouco mais
a filosofia o pensamento corrido que deu a volta sobre si e voltou ao mesmo sítio tudo o que volta aos pesados volumes dos clássicos e das suas discussões  as repetidas quezílias em que andamos entretidos o tempo que passa que passa tempo
o ponto vista sexual a mesma relação homem mulher parece que para sempre ou para muito tempo as novas relações o talvez e a imaginação ou nem isso a lição de história que confirma mas já esquecemos as relações estúpidas e sujas que se repetem as mesmas ânsias os mesmos jogos a mesma guerra já em si exagerada e obsessiva a cultura e a estética que é nada e pode muito bem ser tudo
o teatro no lado errado do texto os que ainda não sabem e agem como pavões ou guias cegos os que sonham e morrem a sonhar os que resgatam alguns devaneios lunares e depois de limpos são postos a uso os sonhos que são a chacota das gerações e depois usados a utilidade do inútil e que se anda a investigar o que fica bem visto e nada tem e nada é o que fala no assunto não sabendo bem o quê o ponto de vista do ponto de vista que se baralha e se dá de novo a guerra das palavras que se anda à procura as palavras de verdadeira utilidade as que fazem comer o tempo vorazmente e as que fingem que nos fazem companhia as palavras que têm um apetite insaciável por vazios
o que é invisível na sua verdadeira dimensão a fome que existe e não se vê as vitimas aos milhões todos os dias o pão esverdeado que foge das mãos e todas as outras coisas que esquecemos e que não sei bem o que dizer as expressões inúteis e estupidamente impotentes a guerra que travo comigo mesmo e que me assassina todos os dias segundo a segundo
os abutres e os urubus sem a culpa da carnificina os milénios passados nos seus olhos mortos a sombra dos predadores do podre e do morto as migalhas e o barulho que fazem a ser ingeridas na natureza e na escuridão o predador que não faz barulho porque não precisa os que se alimentam de almas perseguidas a vitima caída os urubus que não caçam mas esperam o esforço da águia e do gavião que ataca de frente com a dignidade surda as outras similaridades a grande poetisa que escreve sobre isso a sua morada a sua alma com sangue e nervo o poeta belo e novo o pior dos mais tristes o poema complicado que não se percebe à primeira o autor com o nome que ninguém ouviu falar e que ninguém leu a arma de arremesso da má poesia e dos seus eleitos os amantes do poema morto
o poema morto
procurado entre as folhas caídas fora do outono entre lamúrias e gritos e injúrias entre gavetas vazias e estantes com pó o clássico desejado que ainda não foi escrito o poema esquecido apenas porque sim o que procura sempre no outro lado nos outros lados da eternidade os que se reúnem os que se tratam bem os que trocam poesia por aprender a viver os que sabem que a felicidade é efémera e é uma questão de tempo o dia florido nas narinas putrefactas dos abutres e outras hienas o que sofre pela poesia o poeta sofrido o comum leitor em sofrimento o que não teve vida fácil o que foi assolado por todas as tempestades e pelos ventos da inutilidade o que desistirá e que deixará o poema em branco
a pancada sáfara
o anjo com a culpa e a santidade
o velho todos os velhos
o lixo que ninguém despeja
o verme e terra
o homem comum
a igualdade de direitos do pobre ou o que for
o rebelde que não sabe para que serve
qualquer coisa e por pensar em qualquer coisa
o que já aprendeu o jogo
a guerra espiritual, sem precedentes
a guerra paga a prestações de sangue
os tubarões que continuam a comer
os peixes que se deixam devorar
o tempo que passa, que passa o tempo
o ponto vista sexual
a guerra das palavras
as palavras que têm um apetite insaciável por vazios
a guerra que travo comigo mesmo e que me assassina todos os dias, segundo a segundo
os abutres e urubus sem a culpa da carnificina
os milénios passados nos seus olhos mortos
a vitima caída
os amantes do poema procurado entre as folhas caídas fora do Outono
os que trocam poesia por aprender a viver
o comum leitor em sofrimento assolado por todas as tempestades e pelos ventos da inutilidade
o que não desistirá enquanto o poema não terminar

(2)
o outro
há sempre um homem que caminha no outro lado da estrada
o vagabundo desdentado barba revolta e suja blusão camuflado sem dentes o que segura uma garrafa e oferece a quem passa o que dorme no exterior nas horas em que estamos no interior o das noites e estrelas o que conhece todas as sombras nocturnas aquele de quem as baratas não fogem e as mulheres das horas de sobra emprestam o maço para que tire um cigarro o ex-combatente e ex-sobrevivente e actual morto ou vivo vivo ou morto
esse esses da associação conjunta dos becos onde ninguém vai donde ninguém vem donde os ratos nunca voltam da parte de trás do lado brilhante da avenida virada para o mar do lado de lá do néon o varrido com o lixo o que é expulso quando o sol nasce
vai e esconde-te não te queremos ver durante o dia talvez te esqueçamos
a memória dessas existências quando a mão é esticada para o espaço do passeio público
a mulher desumanizada corrompida embonecada caricaturizada embalsemada figura de desenho animado com interior humano essa mulher ao candeeiro solitário encostada onde a rua valsa com a minha sombra e os carros travam onde o passeio brilha da chuva impiedosa essa essas que são o poema
o asco e o poema a solidão e o destempero o horizonte e não apenas de mim mesmo o poema vivo a sua vida com a regra do que cai ao chão do que não flutua nos tempos
amigo descobre o quê talvez te vejas talvez te vejas
o mar que invade a cidade envelhecida para cobrar uma dívida antiga a planície onde nasceram os poetas e que a ela retornam um dia a sombra do sol fogo e dourado que irradia ondas a mulher que sorri junto à igreja a que chora e reza sem perceber porquê o rapaz que espera a sua ninfa e que demorará anos até descobrir se ela o é a expectativa realista que não se realizará o tempo que se sente esvair nas pernas o espaço entre tu e eu e as nossas diferenças a diferença entre nações com séculos de separação a bandeira sem cor os sons sem sentido do experimentador o pato a esvoaçar e o tiro que o irá tirar do enquadramento solar o pé que te pisa na mágoa o ventre que te expulsa e te abraça antes de seres limpo da trampa e sangue com que nasceste tudo o que sonhaste e achas possível sonhar de novo as letras limpas do poema e deitadas fora a raça ganhadora da tragédia o sonho dentro do sonho dentro do sonho e todas as linhas de comboio da tua viagem

(3)
o soalho de madeira velha acabado de lavar o pontapé no balde e a escorregadela nas escadas no andar por cima da casa de lafões no cimo da rua da madalena uma gargalhada e um pedido de desculpas sim foi comigo
a imperial bebida com ócio na tarde de calor na cervejaria Buraco que é um buraco e a recomendação não aceite do empregado para comer qualquer coisa
os passos escorregadios na rua que desce e os bons dias ao senhor gordo na porta da garrafeira
as imensas cabeças na rua que vai dar ao elevador de metal
a subida das escadarias entre as lojas com sapatos à porta e malas e carteiras e pedintes com cornetas de criança a tocarem velhos fados, sim foi comigo
mais uma rua que desce até à montra das guitarras ou sobe até à bifurcação nobre
o elevador rangente do armazém que ardeu
as memórias do velho que fazia mapas de terras não mapeadas e agrestes de Africa
enquanto se bebe um rum com travo a madeira
a montra dos livros com o velho poeta de bigode e chapéu em grande plano
o poema lembrado ao ritmo das pernas que sobem até ao largo do poeta maior e com menos visão que teve um acidente militar com um dos olhos, coitado
as ruas que descem até ao rio
a varina que atravessa entre os paralelepípedos da estrada logo após a descida do eléctrico e sim foi comigo apenas uns metros adiante
as boas tardes ao senhor de bigode retorcido no oculista com o gato na montra
a prostituta que sobe arfante em traje à civil e sorri a dois homens um a um
as duas velhas inseparáveis de sorrisos de batom e perfume de sabão a cacarejarem com o eco da curva da rua
os jacarandás floridos e as esquinas mijadas e os jornaleiros suados e os eléctricos em sinfonia metálica entre bach e o pós-industrial
a avenida maior os comboios ao longe e os bêbados encostados perto do grande portão da tasca o mesmo portão de estrebaria que sobreviveu ao terramoto e fez-me sorrir a ideia e sim foi comigo
a estação aos berros as pessoas que correm os miúdos que gritam e as mulheres de decotes dançantes tudo corre e as cores esbatem-se os raios de sol entram pelo grande tecto
o rio a tasca os homens a cuspirem para o rio e o lixo a espumar e a bater no paredão
mais à frente o grande largo e os barcos que atravessam as margens
apetece ir comer um marisco ao outro lado e como o grande cineasta filmaria um pensamento? que poderia ser este
o táxi verde negro a travar e o condutor suado aos gritos com o governo que não o ouve
relembro a câmara a filmar à volta duma grande árvore num filme sobre a guerra colonial e sim foi comigo eu num cinema gelado e vazio
as ruas do castelo e mais velhas à janela quietas como pinturas impressionistas
a tasca perfumada a carne cozinhada em grandes frigideiras uma velha televisão ronca solitária o dinheiro a esvoaçar nas pontas em cima do balcão de mármore cinzento e a suja ventoinha clap clap
os becos sujos a descer
a velha muito velha igreja de pedra na curva da rua íngreme
o largo onde terminam os eléctricos pessoas atravessam em uníssono
as vassouras penduradas à porta e o cheiro a petróleo e a creolina
o miradouro para as outras colinas e as escadarias numa dança estranha para o bairro das prostitutas e das pensões de janelas abertas donde cantam velhas telefonias e se grita em crioulo, sim foi comigo
o velho restaurante cheio de motoristas e vendedores de cautelas em ziguezague
quando a noite se espreguiça com lentidão e abraça certas esquinas e as sombras colam-se a outros quarteirões e eu ainda vejo o rio
De Oliveira devia ter filmado isto
o poema apenas amachucado numa folha de sebenta suja que esvoaça até à coxa duma mulher estrangeira que me sacode até cair no meio da estrada e ainda resisti meia noite colado ao asfalto

(4)
o calor que te cola ao asfalto que derrete o solo que cozinha os pés
a ondulação do ar que emana como magma em gás
o bairro só
a janela aberta e a mulher despida deitada na cama grande com uma ventoinha que rodopia papéis e cortinados
o homem grande e barrigudo que adormeceu de boca aberta na varanda com plantas tímidas
o gato deitado no mármore velho
o adolescente de boné colorido que atravessa a avenida suja e se encosta ao metal quente dum porsche sem um farol
a transacção feita à luz do dia e na vigilância do sol generoso
a sua namorada que espera na sala da pequena casa adormecida de olhos abertos
a criança que dorme numa cama do seu tamanho
todos os cães do lado da sombra que não se movem e estão sedentos
o desempregado sem um dente que acena com uma pequena garrafa de cerveja morna para o audi descapotável com estofos de cores claras
ouve-se música e não é fado
a velha do outro lado da rua com um saco plástico quase vazio transportado como se pesasse mundos
o pardal que salta para a estrada e que bica sabe-se lá o quê e saltita para o passeio e esvoaça por ali 
o padre que vem despejar o lixo saindo pela porta dos fundos da pequena igreja encurvado o padre não olha para ninguém
o fado enrolado pelo vento a melodia da telefonia que se espreguiça ao sol
o africano sem perna que pede dinheiro semi-deitado no chão frio
todos os negócios da rua de dentro que não constam na economia do país
tudo isso, pá

(5)
o pobre aceita pão duro e mulher velha
uma sombra que dorme de dia e passeia a vergonha dos outros de noite
pobre com sorriso
o céu das estrelas e um lugar aonde aqueço os pés nas noites frias
a cidade toda e a selva a alimentá-la
o pobre e a fuga dos predadores que se alimentam do que já morreu
as colinas velhas que se conhecem como as palmas das mãos
o fado que ainda não cantaram mas que cantarão nas noites mais quentes nas caves perfumadas a sopa de caldo verde e tinto guardado e a nuvem de charuto
os aplausos nas estrofes que falam dum vagabundo esfarrapado com rima inteligente
todas as esquinas provavelmente sujas e vividas que não adormecem com o sono da noite
a noite lenta
a noite suja
e tu não dás por nada
o deus perdido nos bairros do fundo que contam a estória de Eva e não é a que conhecemos
a cidade que já  morreu e só nós é que mexemos
não existimos tapados pela sombra somos milhões
sou a pancada sáfara
e penso ter explicado
boa noite que a madrugada é lenta
a madrugada é lenta
sou o poema

Gosto · · Partilhar
16 pessoas gostam disto.
(Ago. 10 / Jul. 2011)

De vez em quando regresso a este exercício de poema. Nem sei se vai ficando melhor. Mas estava gordo e não se movia. Queria-o simples e seco. Talvez não deva mexer mais.
.
(...)
.
Carlos Teixeira Luis Obrigado pelas vossas palavras. Já tinha desistido deste texto mas como mexi nele partilhei convosco. Bem hajam.
há 11 horas · Gosto · 1 pessoa
.
Victor Nogueira Umas vezes sai logo à primeira, outras custa imenso o tornear e rendilhar. Gostei e retribuo .

Rio Grande - A Fisga.
.

.
Carregado por  em 19 de Dez de 2009
.
há cerca de uma hora · Gosto · 1 pessoa ·

Carlos Teixeira Luis Estimado Vitor, esta canção-letra-interpretação​ é perfeita. Já algum tempo que não ouvia. A nossa rádio que as pessoas ainda ouvem nos seus automóveis despreza o que é em português e saiu há mais de seis meses. Obrigado pelo lembrete e comentário. Um grande abraço.
há 29 minutos · Gosto