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sexta-feira, 13 de julho de 2012

António Viegas - As velhas cruzadas dos novos pregadores


Quebrar sem Partir




As velhas cruzadas dos novos pregadores


A crise, já todos o sabem, mexeu (está a mexer, vai continuar a mexer...) com a vida das pessoas. Não de forma igual para todos. O que para a maioria se traduz em retrocesso e grandes dificuldades, representa para uns poucos a consolidação do seu poderio económico e social. A política, essa, parece alheia ao desenrolar dos dramas pessoais nela originados, relegada para adorno de decisões pretensamente técnicas e objectivas, manietada na lógica de uma ideologia que se afirma anti-ideológica. Manipulada na defesa de interesses pessoais ou de grupos minoritários.

Na génese desta crise encontra-se um facto, pouco destacado, mas de enorme importância na explicação da forma como foram sendo criadas as condições que a ela conduziram, as circunstâncias da sua eclosão e, agora, o emaranhado de situações e a rede de interesses que a perpetua e torna impossível ultrapassá-la. Trata-se da ‘tomada do poder das empresas pelos gestores’. Com o salutar propósito de introduzirem maior racionalidade na actuação das empresas, assumiram o comando da gestão e rapidamente passaram ao controle da decisão, neutralizando (na prática, destronando) os seus proprietários.

A pretexto da ‘criação de valor para o accionista’ e sob o genérico rótulo de ‘técnicas de gestão’, foram introduzindo um conjunto de regras orientadas essencialmente para o seu benefício pessoal. Atribuíram-se si próprios (ou recorreram, para dar menos nas vistas, a ardilosos, mas bem detectáveis, esquemas accionistas cruzados),remunerações obscenas com base em pretensos critérios técnicos, por via da indexação aos resultados obtidos no exercício (a eficácia do imediato sobre a gestão eficiente, pois a longo prazo surgirá, inexorável,... a crise!). Invadiram o espaço político, impuseram a sua forma de gestão aos serviços públicos (que passaram a ser geridos como empresas) e rapidamente se instalou a promiscuidade mais completa entre negócios e Estado, na admissão de pessoas ou na celebração de contratos. A corrupção e o tráfego de influências passou a ser encarado como natural. Em definitivo, a política ficou sequestrada nas malhas dos interesses privados e dos negócios.

Pretender desmontar agora este edifício, laboriosamente erguido ao longo dos últimos trinta anos, pondo em causa os benefícios auto-atribuídos, é tarefa que se apresenta quase impossível, dada a teia de relações estabelecida, dos negócios à política. Mais fácil será o edifício ruir, arrastando todos na derrocada fatal do que os actuais decisores prescindirem das mordomias obtidas e a que se consideram com pleno direito (até por via das normas legais arquitetadas para as alcançar). A ideologia neoliberal que incentiva o empreendedor criativo – fomentando a competição desregulada (ainda que se apregoe o contrário) e a ganância, em detrimento da cooperação e da solidariedade – enquadra e justifica bem toda a agressividade destes comportamentos aparentemente excessivos.

É este, de facto, o grande papel reservado ao actual primeiro ministro, o de arauto e defensor da causa liberal (a sua única formação – mal preparado em tudo o resto!) na impossível missão de justificar a austeridade imposta. Reduzido na capacidade de decisão, refugiado na defesa intransigente do ‘memorando da troika’, cuja política emana directamente de Berlim, Passos desdobra-se em intervenções, nas mais diferentes situações e lugares. As suas conhecidas gafes – o apelo à emigração, o desemprego como oportunidade,... – mais não são, afinal, que doutrina vertida dos manuais da economia liberal, nada de surpreendente, pois.

O ideólogo sobrepõe-se ao político, o missionário prosélito ao estadista sensato. E, acrescente-se, mais em nome de interesses do que causas. A insuportável pose de pregador e a alucinada entoação doutrinária de Passos, o tom convicto que não admite dúvidas nem se perde em incertezas no caminho traçado rumo aos objectivos definidos, denota bem o espírito de missão que o anima. Tal como nos idos dos descobrimentos, em que a ‘dilatação da fé’ justificava e servia de cobertura à mais prosaica ‘expansão dos negócios’, também agora a cartilha liberal esconde e legitima interesses instalados. O pretendido efeito anestesiante, contudo, está já a esgotar-se e até o pregador dá mostras de cansaço, de enervamento, de falta de compostura – o polimento da sua esmerada formação começa a esfarelar! Resta-lhe ainda a via da ‘intentona dos pregos’, na senda do seu frenético mestre e tutor.

Delapidada sem glória nem proveito a tão gabada paciência dos portugueses, a retraída apatia parece agora dar lugar à ameaçadora revolta. O fresco Verão pode trazer um Outono quente!

domingo, 15 de abril de 2012

Um texto de Manuel Duran Clemente


há cerca de uma hora

PRIVATIZAÇÕES....e ainda só íamos em 2002...os números já devem ter triplicado!!!

Sobre isto,e não só, ler Ignácio Ramonet no seu Livro "Guerras do Século XXI,novos medos,novas ameaças" (editado em 2002)...pag 99/100 "Na década de noventa,à escala mundial os Estados alienaram,em proveito de empresas privadas,uma parte do seu património ,avaliada em 513 mil milhões de euros (215 mil milhões no que se refere à UE)...."..."em particular as dos sectores de primeira necessidade(electricidade,gás,água,transportes, telecomunicações,saúde)que asseguram um rendimento regular muito rentável,sem risco,e nas quais os investimentos prévios que podem durar décadas foram realizados pelos governos.".."O principal fenómeno da nossa época,a globalização liberal,não é liderada pelos Estados"...Os pioneiros deste rumo foram Tatcher e Reagan!!!

quinta-feira, 12 de abril de 2012

António Viegas ~ O discurso (e a prática) do ‘nós todos’



DOMINGO, 29 DE JANEIRO DE 2012

Sob capa liberalizante, não há discurso (e correspondente prática) mais anti-liberal do que a dos liberais instalados no poder. Com o argumento de que se torna necessário criar as condições, ou eliminar os obstáculos, ao exercício pleno da liberdade individual, tudo o que antes da conquista do poder era considerado mau, defeito ou erro, passa depois a ser bom, indispensável e certo!!!

Nada de novo, valha a verdade, relativamente a outros detentores do poder que, quando a ele ascendem, procedem exactamente de igual modo, no discurso e na prática. Com uma ‘pequena’ ressalva, porém, que aqui faz muita diferença: o suporte moral do discurso liberal assenta numa pretensa libertação do indivíduo, no sentido da sua autonomia. A começar, naturalmente, pela eliminação do que consideram as amarras do Estado que supostamente o manietam: defesa dos direitos sociais, apoios à integração social (contra a exclusão), medidas contra as desigualdades,...

Liberto de todas as amarras, políticas e sociais, o indivíduo ficará então apto a expressar todas as suas capacidades e a desenvolver todas as suas potencialidades: ‘Fim da História’! ‘Piedosos’ propósitos, contudo, que esbarram na contradição do discurso liberal do ‘nós todos’, que os faz passar do extremo individualismo, a um espúrio colectivismo socializante!? Utilizado tanto pelos políticos enfeudados, como por analistas prosélitos, constitui peça essencial no discurso de justificação da estratégia liberal de combate à actual Crise:

‘Nós todos’ temos consciência de viver acima das nossas possibilidades!
‘Nós todos’ percebemos que não há alternativa à austeridade, que ela é inevitável! 
‘Nós todos’ sabemos que se trata de pessoa muito competente (quando se fala do Catroga da EDP, do Frexes da AdP, do Vasco do CCB, do Costa do BP, de qualquer nomeado de ‘confiança’)!
‘Nós todos’ já intuímos que vamos perder regalias e até direitos adquiridos!
‘Nós todos’... sem excepções nem contestação!

Mas este discurso unanimista em que, sem consulta ou delegação, nos pretendem envolver pondo alguém a falar por nós como se reflectisse o pensamento de ‘todos’ – a narrativa do denominado pensamento único – não difere muito, na substância, de outras práticas de coarctação das liberdades individuais, seja por motivos políticos, religiosos ou meramente ideológicos. Apenas a forma é mais rebuscada e não reveste a violência física utilizada noutras situações para garantir, no fim de contas, os mesmos efeitos, o enfeudamento unânime de posições à política de descarada defesa dos interesses privados – sob pretexto de assim melhor se protegerem os públicos!

Trata-se, afinal, da versão liberal daquilo que mais verberam, seja o fundamentalismo religioso (islâmico, pois claro, dificilmente se atrevem a caracterizar deste modo práticas cristãs de idêntico teor), seja a tão esconjurada tese da ‘ditadura do proletariado’. O fundamentalismo (ou ditadura) destes iluminados liberais revela-se fanaticamente disposto a salvar o mundo de todas as tiranias, pela imposição de uma única: a que se acoberta na‘sua’ ideologia da liberdade (ou antes, na ideologia da ‘sua’ liberdade), precisamente a que, através do exercício do poder, lhes garante o acesso à riqueza e à exclusividade, lhes permite toda a discricionariedade!

Não surpreende, pois, o ataque que é feito a direitos básicos, mesmo tão essenciais à vida como são os cuidados de saúde, em nome, claro, de uma suposta maior eficiência económica – que assegure, é essa a expectativa destes iluminados, a preservação de tal exclusividade. Pouco importa se à custa da redução da qualidade de vida da maioria, até mesmo de muito sofrimento!

Respigo excertos de uma entrevista recente a Daniel Bessa: ‘Um dia vai ter de se por em questão o Serviço Nacional de Saúde. (...) Uma pessoa como eu deve pagar a saúde’. O raciocínio está invertido. É precisamente para poder ser como é e continuar a distanciar-se (quantas vezes? 10, 20, 100, 200,...?) da imensa maioria que apenas consegue sobreviver, é que ele se propõe pagar a saúde – e também a educação, a reforma, a mobilidade,... Seguramente até já a paga, nos privados a que recorre, dificilmente este assanhado guru liberal (a quem, por um dia ter passeado de braço dado com Guterres, se colou o rótulo de socialista!) se sujeita às ‘bichas’ do SNS!

Tudo o que foi sendo construído e hoje constitui o edifício do Estado Social Europeu – conjunto de direitos básicos imprescindível ao exercício da cidadania (mesmo considerando as diferenças que separam os diversos sistemas nacionais) – é posto em causa a partir da sua base: na opinião destes exacerbados liberais, tudo deve ser tendencialmente pago (mesmo que isso contrarie o preceito constitucional que fala em... tendencialmente gratuito ), pois esse é o argumento para poderem manter as distâncias e a justificação para continuarem até a aumentá-las.

Em nome da liberdade, são destruídas as condições mínimas que permitem o seu exercício!

Publicada por AVCarvalho às 21:41


António Viegas ~ Democracia ou mercado – a alternativa de uma opção inadiável – III



SEGUNDA-FEIRA, 12 DE MARÇO DE 2012

A democracia como alternativa ao mercado
Perante os efeitos devastadores da Crise, nomeadamente no plano social, com o desemprego a atingir, em algumas regiões, níveis próximos da desagregação social, a solução do crescimento económico impulsionado pelo aumento das exportações, apresentada como panaceia universal, revela-se de difícil senão impossível concretização (pelo menos em todos os lugares, ao mesmo tempo: os ganhos de produtividade alcançados por essa maior competitividade externa, diluem-se a nível global, pois os excedentes de uns são os déficit de outros!).

Mas para além dessas dificuldades e de subsistir sempre, no contexto do sistema capitalista, o problema da sustentabilidade desse crescimento (por força dos limites à competição, cf. referido em comentário anterior), uma alternativa assente apenas neste pressuposto não se apresenta nem eficaz nem sustentável a longo prazo, como as próprias condições que determinaram a crise indicam. Foi a insuficiência da procura e a tentativa de a compensar através do endividamento (sobretudo privado) que gerou a crise e a arrastou para o beco em que se encontra. Daí que a única alternativa viável deva ser procurada na esfera da repartição do rendimento, antes até de se avançar para o crescimento (qualquer que seja a natureza deste).

Partindo da receita neoliberal para o crescimento – aumento da competitividade pela via usual da redução salarial – M. Husson esclarece (Esquerda.net, 5/Ag./11): “Como o crescimento será fraco no período aberto pela crise na Europa, o único meio para um país criar empregos, será ganhar parte deles aos países vizinhos, tanto mais que a maioria do comércio externo dos países europeus se faz no interior da Europa. Isto é verdadeiro até para a Alemanha(...), que não pode contar só com os países emergentes para o seu crescimento e os seus empregos. As saídas neoliberais da crise são, pois, por natureza não-cooperativas: só se pode ganhar contra os outros e é este o fundamento da crise da construção europeia.

Em contraste, as soluções progressistas são cooperativas: elas funcionam tanto melhor quanto se estenderem a um maior número de países. Se todos os países europeus reduzissem a duração do trabalho e taxassem os rendimentos do capital, esta coordenação permitiria eliminar os ataques a que seria exposta esta mesma política conduzida num único país” (em resposta ao argumento de que tais políticas ultrapassam o quadro nacional).  E avança, desenvolvendo : “A subida da parte dos salários poderá seguir a regra dos três terços: um terço para os salários directos, um terço para o salário socializado (a protecção social) e um terço para a criação de empregos através da redução do tempo de trabalho. Esta progressão far-se-á em detrimento dos dividendos, que não têm qualquer justificação económica nem utilidade social.”

Constituindo o desemprego e a precariedade os principais problemas sociais, agora fortemente agravados pela crise, importa então sublinhar que, se não basta aumentar a competitividade para crescer, não chega crescer para se poder ampliar o emprego. Porque fundamental é crescer criando empregos úteis, aptos a satisfazer necessidades sociais, criando riqueza, pois só assim é possível garantir um crescimento sustentável. Com óbvios benefícios para o ambiente.

Para as principais conclusões deste importante debate por fazer (mas já por várias vezes aqui chamado antes), recorro de novo a M. Husson, que põe toda a ênfase na afirmação de que “não é aos economistas que cabe decidir este debate”, pois uma verdadeira saída da crise passa pela opção política da adopção de “três ingredientes indispensáveis:

1. uma modificação radical na distribuição dos rendimentos;
2. uma redução massiva do tempo de trabalho;
3. uma ruptura com a ordem mundial capitalista, a começar pela Europa realmente existente.”

Isso implica, antes de mais, o regresso à política, a substituição do mercado pela democracia. Só um ambiente efectivamente democrático, liberto da utopia liberal do mercado livre (a utopia que realmente conta), propiciará condições de progresso e de bem-estar geral. Base imprescindível ao desenvolvimento de uma estratégia de luta europeia comum que, no imediato, privilegie a resistência às políticas de austeridade e exigências no campo da reforma fiscal, do controlo dos capitais, da auditoria à dívida (apurando a que resulta da liberalização/especulação financeira, base para a sua legítima reestruturação e o posterior controlo democrático). 

As perspectivas, contudo, não parecem animadoras e propícias ao grau de consciencialização política exigido. Um recente estudo de opinião sobre a condução da política nacional e possíveis alternativas, traça um quadro desolador das expectativas dos inquiridos sobre os seus intérpretes: a par de larga maioria (62%) considerar má a prestação dos detentores do poder, uma maioria ainda mais alargada (73%)%, não confia em qualquer partido da oposição para fazer melhor! Mas a insatisfação que traduz com a acção dos políticos representa, por um lado a rejeição de uma certa forma de fazer política e alimenta, por outro a esperança na construção de uma alternativa mais autêntica que os arremedos actuais produzidos pelo formalismo das eleições.

Enquanto isso, a persistência na alternativa do primado do mercado – e no culto do individualismo extremo – conduzirão, inexoravelmente, à desagregação: dos negócios, das comunidades, do território!

Publicada por AVCarvalho às 19:48 

 http://quebrarsempartir.blogspot.pt/2012/03/democracia-ou-mercado-alternativa-de_12.html

António Viegas ~ Democracia ou mercado – a alternativa de uma opção inadiável – II


Quebrar sem Partir



SÁBADO, 10 DE MARÇO DE 2012

O mercado contra a democracia
Contra todos os fundamentalismos de mercado (dos negócios, da política, da ideologia,...), foi a intervenção do Estado, pois, que salvou o sistema da derrocada que a Grande Depressão parecia ir provocar. Mas se as lições da História facilmente se esquecem, mais difícil se torna apagar-lhe os traços culturais entretanto impressos, sobretudo se estes se traduzem na difusão de novos saberes, técnicas ou modos de vida. A maior presença do Estado nas sociedades, contribuiu para alargar de forma decisiva o acesso aos avanços da ciência e do progresso, expressa na fixação de um novo patamar de direitos públicos na construção do Estado de Direito, os direitos sociais (depois da conquista dos direitos civis e dos direitos políticos). 

A luta contra o Estado esconde sobretudo o propósito de se substituir a política pelo mercado. A de se considerar o mercado imprescindível à democracia, pois só ele permitiria a liberdade económica. O que a prática política indica, porém, para além de qualquer polémica ideológica, é que, no final, por esta via o mercado substituiu a democracia na maior parte das decisões sociais e políticas. Seja no espaço nacional ou nas instituições internacionais. Tudo na actualidade se subordina às regras do mercado global. Sob a capa de aparentes soluções técnicas pretende-se fazer passar a ilusão da falsa isenção das opções políticas.

Importa frisar agora e sempre: o domínio do mercado não é uma mera abstracção ideológica, tem expressão concreta na criação e manutenção dos privilégios da minoria que o defende e na degradação ou mesmo destruição dos direitos sociais da imensa maioria que o ignora (ou ‘finge’ ignorar-lhe os efeitos, por via da cerrada manipulação mediática de que é vítima). Em nome dos mercados, impõem-se programas de austeridade sobre cidadãos que em nada contribuíram para os desequilíbrios financeiros que lhe servem de pretexto, mas garante-se a manutenção e até o reforço de faustosos estilos de vida exclusivos a certas camadas da população, pouco ou nada afectados pela Crise.

Não surpreende, pois, a defesa acérrima dos mecanismos do denominado ‘mercado livre’, por parte dos seus principais beneficiados ou dos que, de algum modo, tiram partido dessa situação. No contexto da UE, o seu paradigma é o famoso art. 107 do Tratado de Maastricht (replicado no de Lisboa) que estabelece a autonomia do BCE perante o poder político e os Estados, prerrogativa que nenhum outro sistema financeiro nacional admite. Autonomia que o autoriza a ceder fundos a 1% aos bancos comerciais, para estes os emprestarem a taxas 3, 4 ou mais vezes superiores aos Estados, que, por sua vez, se encarregam de extorquir das respectivas populações os recursos para fazer face a tal transferência de valor, num ignominioso processo de recapitalização bancária feito à custa do agravamento das condições de miséria da grande maioria das pessoas!

Nada, porém, de muito surpreendente ou fora de vulgar, tendo em conta o cabalístico e esconso contexto financeiro em que tudo isto se processa. Perante os efeitos já conhecidos da crise nele gerada, escasseiam os adjectivos para qualificar a manutenção de uma situação socialmente ruinosa. Recorde-se que o sistema financeiro paralelo (‘shadow banking system’ e as célebres OTC fora de qualquer controle, à cabeça os opacos Hedge Funds e as famigeradas praças ‘off-shores’) representava, em 2007 (segundo o insuspeito Federal Reserve Bank de Nova Iorque), quase o dobro das transacções inscritas nas contas do sistema bancário, estimando-se que ainda hoje, depois da crise e dos ajustamentos subsequentes, as operações ‘clandestinas’ sejam superiores às registadas em mais de 20% – com nefastas repercussões na consequente e colossal evasão fiscal e no branqueamento das redes criminais!

Tudo isto foi (é) possível por o mercado se haver substituído à democracia! Por se considerar possível, até desejável, que as regras ‘automáticas’ do mercado se sobrepusessem ou pudessem prescindir do controle das regras democráticas. Por se aceitar que a determinante económica, sem dúvida a base real da sociedade, assumisse igualmente o papel de dominante política, sob comando absoluto do mercado, actuando sem tutela nem controle.

Os resultados estão à vista: o sofisticado exclusivismo do modo de vida de uma escassa minoria assim conseguido (planeado de forma intencional), só tem paralelo no extremar das desigualdades sociais, no acentuar da degradação ambiental, na criação até de inultrapassáveis impasses económicos ao... próprio mercado!
(...)
Publicada por AVCarvalho às 12:20 

http://quebrarsempartir.blogspot.pt/2012/03/democracia-ou-mercado-alternativa-de_10.html

António Viegas ~ Democracia ou mercado – a alternativa de uma opção inadiável – I


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QUINTA-FEIRA, 8 DE MARÇO DE 2012


O mercado acima da política
Quando, em Setembro de 2008, a falência do Lehman Brothers prenunciou um eminente colapso financeiro mundial e a ameaça se estendia mesmo à derrocada do próprio capitalismo (cf. Attali), em pânico os responsáveis políticos dos maiores blocos económicos anunciaram a sua disposição de intervir rapidamente sobre as próprias condições de funcionamento do sistema. De um lado e do outro do Atlântico sucedem-se reuniões e decisões numa frenética corrida contra o tempo com vista a repor a confiança no abalado sistema financeiro. Para além do reforço das garantias aos depositantes e de precipitadas nacionalizações de inúmeras instituições bancárias e seguradoras, um pouco por todo o lado, em Novembro os ministros das Finanças da UE acordam numa reforma em cinco pontos, em que os dois mais emblemáticos eram o controle das agências de rating (ainda longe dos ‘estragos’ que posteriormente viriam a provocar) e a interdição das praças financeiras off-shores!

Passado o susto, porém, tudo isto foi esquecido e o mundo retomou o caminho da ‘normalidade’, de forma ainda mais acentuada: especulação financeira ditada pelo domínio absoluto das regras do ‘mercado livre’ (as agências de rating assumem o poder efectivo nas decisões políticas); transferência de recursos do trabalho para o sector financeiro (reposição do valor destruído pelo rebentamento da ‘bolha’ especulativa) com base no discurso da inevitável austeridade, seja directa ou indirectamente com a destruição do Estado Social! Em nome de uma propalada eficiência dos mercados, tanto mais possível – assim reza a doutrina – quanto mais livres eles forem!

Quando, no início dos anos 30 do séc. XX, o capitalismo parecia enredado (e prestes a soçobrar) na pureza dos princípios do ‘mercado livre’, o conservador lorde britânico J.M. Keynes percebeu que só a intervenção do Estado na economia (contra todos os dogmas, pois) o poderia salvar de uma morte anunciada. Foi do intervencionismo keynesiano, juntamente com a experiência do New Deal de Roosevelt (também fortemente intervencionista), que resultou a lenta negociação do Pacto Social na origem do moderno Welfare State, o qual garantiria ao mundo capitalista o seu maior período de paz e prosperidade – os 30 gloriosos anos – não obstante a importância, para ambas, de um contributo tão improvável como o propiciado pelo clima ameaçador da Guerra Fria no equilíbrio mundial (o equilíbrio do terror).

Não foi pacífica – e muito menos isenta de acesa luta ideológica (além da política, sindical,...) – a ascensão das ideias que conduziram à adopção do modelo de Estado Social. Desde cedo Hayek e a ‘sua’ escola austríaca, posteriormente organizados na Societé Mont Pèlerin, encetaram uma autêntica cruzada tendo como propósito o combate ao colectivismo, considerado no sentido mais amplo do termo, nele englobando os regimes fascista, nazi, soviético e, pasme-se, a então nascente teoria keynesiana, acusada da suprema heresia de pretender estabelecer uma via intermédia entre a economia de mercado e o recurso à intervenção estatal.

Como se sabe, esta cruzada levou à vitória, já nos anos 80, do ‘thatcherismo’ no Reino Unido e do ‘reaganismo’ nos EUA, aqui com o esteio do talvez principal guru das ideias neoliberais, Milton Friedman. O seu objectivo confesso passa pela desestatização da sociedade, libertando o indivíduo da tutela do Estado, tido como o grande obstáculo à completa expressão das suas capacidades. Na prática, pretendem afastar a política do caminho do mercado, sob pretexto de as supostas soluções técnicas que este induz serem mais eficientes na aplicação dos recursos e neutras na decisão (não comprometidas com as partes envolvidas). Deste modo, toda a regulação social, tanto a nível económico como político, pertenceria ao Mercado, mecanismo que, dizem, assegura uma alocação óptima dos recursos escassos e a sua hipotética neutralidade seria o garante da isenção e eficiência nas opções a tomar. Ao contrário do Estado que, segundo eles, capturado por grupos de interesses, tenderia a ser ineficiente e até corrupto.

A opção do mercado em detrimento do Estado – contra a política, pois – favoreceu, como se previa (e talvez fosse esse o seu propósito) os interesses dos mais poderosos, desprotegeu de forma irremediável os mais fracos e excluídos. Em nome da eficiência e dos mais capazes. A selecção produzida beneficiou um número restrito de pessoas, mas determinou um interminável rol de problemas. Que desembocam agora na maior Crise sistémica de que há memória!
(...)
Publicada por AVCarvalho às 22:36

http://quebrarsempartir.blogspot.pt/2012/03/democracia-ou-mercado-alternativa-de.html