Sabes como partir?
perguntou-lhe ela, desta vez fixando-lhe os olhos claros.
sabes como podemos ir-nos assim, sem que ninguém dê conta, como o sol quando baixa no horizonte e se despede e não o sentimos porque é só um instante apenas, um fechar de olhos momentâneo como um suspiro de estrelas?
disse ela sem esperar que ele lhe respondesse porque os seus olhos eram lençóis de despedida e os lábios rios mudos e quedos onde não se enredavam beijos...
Sabes como se faz para apagar da nossa memória o calor dos amplexos em que nos fizemos um só, tantas vezes, até nos desfazermos de ternura e transformá-los depois em sombra e névoa, em sal e vazio?
Sabes como dizer-te, já não te amo, quando as noites são páginas virgens à espera de que nelas inventes a poesia com que eivas o meu sono?
Sabes como se morre?
perguntou tão baixinho que as nervuras das folhas do livro onde moravam, se desfizeram em desenhos carcomidos e o magma negro da tristeza lhe abrasou as veias.
Sabes como conseguir dizer-te que te apartes enquanto me rasgo em pedaços e me costuro, enfiando a agulha sempre no mesmo lugar?
Sabes como se morre?
Sabes como se morre devagar ?
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