Chegou o tempo / avança, meu país
“Quando o homem é maior que o chão que pisa não há limites para a ambição”.
É a minha última noite na cidade da mágoa. Há que ver um pouco mais para além da linha do horizonte: um homem não pode caber apenas no chão que lhe deram. Foi por isso que o meu País ficou maior que ele próprio e ganhou o tamanho da visão de um homem e de outros que lhe deram a mão. O meu País não acaba onde começa o medo e se alguém inventou o mar para além do medo e fez de nós donos do mundo não serei eu a deixar de crer até onde existir esperança, ambição e sentido de liberdade.
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Não aceito o cheiro de gritos congelados em rostos fechados, não recebo na alma o relento de ocupações de um pavor indefinido. Urge saber o nome e a ocupação de quem atiça gritos de velhas guerras longínquas quando mantos de viuvez cobriam campos e vilas com uma dor muito calada que asfixiava sonhos no peito de cada um e de todos num silêncio amortalhado.
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Hoje, os jovens que abandonam a terra não o fazem com o sentimento de desesperança das andorinhas quando pressentem o fim da primavera, hoje o mundo é uma mistura de ruídos metálicos e a nossa paixão vai para além do pisar do chão da lua. A ambição do homem, hoje, vai muito para além do espaço que os seus sapatos ocupam e já não há paragens distantes. O mundo está mesmo aqui ao lado e já não há juventudes amortalhadas em silêncios ou falta de ar. E não vale escutar vozes ocultas traficando desesperanças nas esquinas, cúmplices, pela calada das noites.
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Hoje, mais do que nunca, há que manter o lume aceso, mesmo quando ele esmorece na alma dos homens, há que soprá-lo com força, ramo a ramo, como quem passa a palavra para que, mesmo no fundo do buraco mais escuro, se mantenha viva a brasa da esperança.
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Longa foi a noite que vivemos muitos de nós, o amanhecer foi lindo, com as armas fizemos poesia numa madrugada leve, entusiasta, peculiar e fantasista de soldados dançando com o povo.
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Hoje, o que mais importa é não provocar desastres nos que navegam, não intoxicar gentes até ao desmaio, não demolir a beleza que ainda existe, como todas as tiranias tão bem sabem fazer.
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Hoje há que conhecer regras, definir limites, respeitar direitos, matar o pavor e, mais uma vez,navegar para além do medo. Um encontro mal marcado pode surpreender-nos mesmo ao virar da esquina e eu que já tentei ser muitas para escapar de mim, não quero surpreender-me vendo-me abraçada a um banco de nevoeiro a irromper do nada.
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Avança, Portugal!
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Clara Roque Esteves ( Lisboa, Outubro de 2010)
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* Este texto carece hoje apenas de algumas atualizações. A situação dos jovens é muito pior do que a descrevi ao tempo. Os desastres foram provocados e o barco está a afundar-se. Continuo a não querer ver-me abraçada a um banco de nevoeiro.
( Outubro de 2011)
Tu e 2 outras
pessoas pessoas gostam disto.
Invejo-te
Clara, não tenho a esperança que te vai na alma. Posso até continuar a navegar
para além do medo, posso até resistir ao choque mas a brutalidade, a frieza e o
'austeritarismo' que nos é imposto, é de tal ordem que prevejo décadas de retrocesso e até já sinto o cheiro
bafiento da noite longa que vivemos, na esperança da manhã clara. Existe um
irremediável afastamento entre os sonhos que eu tinha e as ameaças que pairam
no ar. Perante esta selvajaria reduzo-me à minha insignificância na tristeza de
saber que já não assistirei ao romper da aurora. Neste momento não consigo
pensar de outra maneira.
há cerca de uma
hora · Gosto
A única
diferença, Ana, entre o antes e o agora, é que muitos de nós vivemos o
"sonho" do 25 de Abril mas Mário Soares foi muito claro após vencer
as eleições dizendo que arrumara o "socialismo" numa gaveta para
confessar despudoradamente numa alentada entrevista em 3 volumes a Maria
João Avilez (já não tive pachorra para comprar e ler o 3º volume) que ele, (tal
como o PSD/CDS)[e esse farsante do Otelo] haviam mentido, que o socialismo não
era o seu objectivo mas que o fizeram pois doutro modo não teriam ganho
eleições.
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A agenda de
Soaress/Alegre e dos que se lhe seguiram no PS(D)CDS é a agenda da Cia e da
República Federal Alemã, do grande capital transnacional. O pesadelo de que
falas e receias foi ou já é o dos povos, civilizações e economias destruídos
pelos cristãos em nome da civilização e agora da fome, da guerra e da miséria
crescentes em África, na America Latina, em muitos países asiáticos e nos
antigos países socialistas, para cuja queda a Igreja Católica deu um grande
contributo através de João Paulo II, por isso apressadamente beatificado.
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Nós vivíamos
aqui neste cantinho fiados na proteção da senhora de Fátima e do Futebol.
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E a
perspectiva é ou a humanidade destrói o capitalismo ou este destrói a
humanidade. Ao pé disto, as angústias dos/das portugueses/as nada são, nada
valem por sí só. E lembra-te, Ana, que o capitalismo teve de lutar contra o
feudalismo, com um rasto de sangue, morte e miséria, para prosseguir
exterminando povos, civilizações e culturas muito mais avançadas, quer do ponto
de vista tecnológico, quer do ponto de vista da relação com a Natureza. Já lá
vão cerca de 5 séculos desde que o capitalismo surgiu e só agora, após a queda
dos países socialistas, está a tentar estender-se por todo o planeta, já sem
máscaras. O punhado de sub-humanos que governa o mundo em seu proveito tem
muita ronha, sabedoria de exploração e mentira mas muitos povos continuam ou
começam a resistir.
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Bjo e ânimo,
Ana A batalha é dura mas do contributo e da força de ânimo de cada um de nós
depende o resultado final. Que espero seja a derrota deles e a sobrevivência e
o renascer da Humanidade !
há 7 minutos · Gosto
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