O prometido é devido, assim, aqui vai o
Cama - take two
Nada é mais belo do que um leito de amor. Nada é mais ingénuo, nada é mais crédulo. Nada fere mais quando nele se instala o ermo das palavras e dos anseios.
Porque a paixão é supernova, esplendor estonteante que se desfaz em negritude…
Esgotaram-se as noites, esgotou-se a pele, não havendo nela mais nada a despir, afunilou-se o amor e cada um voltou a ocupar o seu canto, uma tira de lençol onde os suspiros não se aventuravam a ir além da linha imaginada e um só rectângulo chegava na sobreposição missionária dos corpos…
Os dedos não tinham olhos e seguiam cegos o caminho em sulcos cavados pelo escopro do desejo nos corpos amarelecidos pelos anos. A água adormecia esquecida de matar a sede que teimava em se esconder nos poros abertos de lembranças. Nas cinzas requentadas nem uma língua de fogo, nem o vento arrepiando a penugem das asas de um desejo amarrotado. Uma pele esfregando-se na outra sem o cheiro adocicado das flores que outrora havia, nem os desmaios das palavras em monossílabos doces.
Enrolaram-se os lençóis numa trança angustiada e alguém a desfez e fugiu à cata de outros seios, outros ventres, outros ais…
Ficou a cama como um deserto onde o dorso dela se enovelava sobre si mesmo, fervilhando de pirilampos pardos. Gozo e choro, só seu, feito de todos os momentos e de todos os homens, misturados na mesma saliva, fendendo a alma abismada em martírio e solitude.
Pelo quarto, oásis de carícias espartejadas, flautas de bisel e guitarras de fina cintura em concertos de cigarras mudas e a imensidão da cama onde serpentes chamejantes se prendiam nos dosséis da noite. No leito de sussurrantes arquejos um corpo cavalgava sem montada, em coreografia solística. Raízes húmidas cruzavam-se num céu de plúmbeas fantasias, enquanto uma morte suave lhe entorpecia os músculos cansados.
maria jorgete teixeira
imagem retirada à navegação...
Sem comentários:
Enviar um comentário