“ O INTRUSO “
Já esta rua se acende,
Crepitam carvões ao rubro,
Há fogos que apagam todo
O mal que nos apoquenta.
- Sai um canjirão de vinho
Pr’ aquela mesa do canto,
Da cor do sangue, meu Santo,
Branco é refresco, não conta
E verde é tom de garrafa,
Tens unhas ? Toca guitarra,
Em Alfama, com carinho,
Ou vens pregar aos peixinhos ?
Traz-me um copo de ternura
Para disfarçar a amargura,
Não é pôr lágrima na saudade,
Que eu dessa marca não gasto,
Mas afina-me a verdade,
Pr’ o canto que nunca cansa
E enquanto danço me encanta
Teu sorriso de criança.
- Olha o gato a dar ao rabo,
Se for coelho está frito,
Até lhe assava o chouriço,
De promessas estou eu farta…
Eu quero é viver, sentindo !
Dá-me o tom das quadras soltas,
E um tostão para o Santo António,
Deixas-me a rosa murchar ?...
Estou a sentir o demónio
Pelas minhas pernas trepar.
Pinga a sardinha no pão,
Passa a batata quente,
Por aqui, de mão em mão,
Tenho uma perna dormente…
Mas frio, isso, ninguém sente.
- Estás-me a apalpar, meu palhaço ?
- Desculpe, foi sem intenção…
Não te armes em patrão,
Tu, aqui, não vales um bagaço,
Se entraste foi por vingança
Dos tempos que já lá vão,
Estás m’ ouvir Falinhas – mansas ?
Tua mão não tem retorno,
O Povo já não tem dono,
Queres comer e não pagar,
Vai mas é chuchar num corno,
Que para ti nem posso olhar,
Só me apetece morder,
Mas tu nem sabor deves ter,
Estás encostado ao poder,
Vens aqui para provocar ?...
- Tu não me faças lembrar,
Ó toupeira sem miolo,
Por quantas ruas te vi,
Armado em bicho parolo,
Ainda eu era Menina,
A roçares o cu p’las esquinas,
Apenas para espiares
Os que viviam aqui.
Das mulheres querias ser dono
E aos homens escravizar
- Cale-se já sua matrona,
Se os seus filhos quer salvar;
Tão bem te lembras de mim,
Queres– me, agora, ignorar ?
Temos contas a ajustar,
Não te hás de livrar assim.
- Santo Antoninho nos valha,
O que é que eu faço a esta mortalha
Que é da casca d’ Oliveira
Ou à sua sombra se ajeita?
Estão-me a chegar os azeites,
Melhor não te dar cavaco,
Saíste do teu buraco,
Estás morto, mas não aceitas ?
Isto não é o da Joana,
Como tu julgas, meu bácoro,
Queres festa, mas não me enganas,
Ainda te corto o cachaço
Do resto faço couratos,
Se não pagas adiantado.
E se te poupo a costela,
É porque essa curvatura
De cerdo da ditadura
Não me entra na panela.
Siga a marcha que é tão bela,
Já se esfumou o retrato
Desta sombra do passado
Que aqui passou na viela.
Carlos A.N. Rodrigues, 7 / 06 / 2013
Já esta rua se acende,
Crepitam carvões ao rubro,
Há fogos que apagam todo
O mal que nos apoquenta.
- Sai um canjirão de vinho
Pr’ aquela mesa do canto,
Da cor do sangue, meu Santo,
Branco é refresco, não conta
E verde é tom de garrafa,
Tens unhas ? Toca guitarra,
Em Alfama, com carinho,
Ou vens pregar aos peixinhos ?
Traz-me um copo de ternura
Para disfarçar a amargura,
Não é pôr lágrima na saudade,
Que eu dessa marca não gasto,
Mas afina-me a verdade,
Pr’ o canto que nunca cansa
E enquanto danço me encanta
Teu sorriso de criança.
- Olha o gato a dar ao rabo,
Se for coelho está frito,
Até lhe assava o chouriço,
De promessas estou eu farta…
Eu quero é viver, sentindo !
Dá-me o tom das quadras soltas,
E um tostão para o Santo António,
Deixas-me a rosa murchar ?...
Estou a sentir o demónio
Pelas minhas pernas trepar.
Pinga a sardinha no pão,
Passa a batata quente,
Por aqui, de mão em mão,
Tenho uma perna dormente…
Mas frio, isso, ninguém sente.
- Estás-me a apalpar, meu palhaço ?
- Desculpe, foi sem intenção…
Não te armes em patrão,
Tu, aqui, não vales um bagaço,
Se entraste foi por vingança
Dos tempos que já lá vão,
Estás m’ ouvir Falinhas – mansas ?
Tua mão não tem retorno,
O Povo já não tem dono,
Queres comer e não pagar,
Vai mas é chuchar num corno,
Que para ti nem posso olhar,
Só me apetece morder,
Mas tu nem sabor deves ter,
Estás encostado ao poder,
Vens aqui para provocar ?...
- Tu não me faças lembrar,
Ó toupeira sem miolo,
Por quantas ruas te vi,
Armado em bicho parolo,
Ainda eu era Menina,
A roçares o cu p’las esquinas,
Apenas para espiares
Os que viviam aqui.
Das mulheres querias ser dono
E aos homens escravizar
- Cale-se já sua matrona,
Se os seus filhos quer salvar;
Tão bem te lembras de mim,
Queres– me, agora, ignorar ?
Temos contas a ajustar,
Não te hás de livrar assim.
- Santo Antoninho nos valha,
O que é que eu faço a esta mortalha
Que é da casca d’ Oliveira
Ou à sua sombra se ajeita?
Estão-me a chegar os azeites,
Melhor não te dar cavaco,
Saíste do teu buraco,
Estás morto, mas não aceitas ?
Isto não é o da Joana,
Como tu julgas, meu bácoro,
Queres festa, mas não me enganas,
Ainda te corto o cachaço
Do resto faço couratos,
Se não pagas adiantado.
E se te poupo a costela,
É porque essa curvatura
De cerdo da ditadura
Não me entra na panela.
Siga a marcha que é tão bela,
Já se esfumou o retrato
Desta sombra do passado
Que aqui passou na viela.
Carlos A.N. Rodrigues, 7 / 06 / 2013
Sem comentários:
Enviar um comentário